Wado - O Manifesto da Arte Periférica (2001)

Wado, o catarinense adotado por Alagoas estréia com este manifesto pela valorização da música produzida fora do eixo Rio-São Paulo. Jorge Ben, Black Rio e Luiz Melodia foram algumas das referências deste disco conceitual que experimenta timbres e traz letras fortes sem exageros panfletários e sem esquecer de canções de amor e para dançar. Ou melhor, para sambar.

O Manifesto da Arte Periférica (2001)
1. A Tragédia da Cor
2. Alagou As
3. Uma Raiz, Uma Flor
4. Feto
5. Diluidor
6. Beijou Você
8. Ontem Eu Sambei
9. A Linha Que Cerca o Mar
10. Um Um
11. A Coisa Mais Linda do Mundo

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Veja o que saiu na imprensa na época do lançamento do álbum:

Wado traz seu manifesto periférico
(Antonio Carlos Miguel, O Globo, 30-06-2001)
Hoje o principal centro de renovação do rock brasileiro, o Nordeste agora também acena com a MPopB vanguardista do cantor e compositor Wado. Aos 23 anos, vindo de Maceió (apesar de nascido em Santa Catarina), ele estréia com o curioso disco “O manifesto da arte periférica”, lançado pela Dubas Música, gravadora do compositor Ronaldo Bastos, distribuída pela Universal.
— O manifesto é o disco, são as minhas canções, que mostram a força do que é produzido fora do eixo Rio-São Paulo — diz Wado, que gravou o CD no estúdio do Sonic Junior, um dos muitos grupos da ativa, e desconhecida no Sudeste, cena musical alagoana. — É a mais forte do Nordeste, a mais promissora, com bandas como Santo Samba, Dred, Mopho e Sonic Junior. Além dos shows das velhas-guardas, com um “Buena Vista” em cada morro da cidade.
Em sua formação Wado mistura influências de Jorge Ben, Banda Black Rio, Novos Baianos e Luiz Melodia com o grupo funk de Nova Orleans The Metters, o trio fusion Medesky, Martin & Woods ou a banda Gallatica. Ronaldo Bastos diz que a capacidade de incorporar sotaques e apresentar algo original foi o que o atraiu no trabalho de Wado:
— Ele não parece com nada, mistura várias coisas sem soar eclético — diz Bastos. — Nada na música de Wado soa pretensioso, embora o trabalho seja cheio de intenções. Ele fez da música aos desenhos da capa e, depois de gravar com o dinheiro que não tinha, veio com o disco debaixo do braço para o Rio cheio de coisas para dizer.
Sambas turbinados pela eletrônica, ecos da bossa nova e do funk estão entre os ingredientes do manifesto de Wado, em canções como “Uma raiz, uma flor”, “Diluidor”, “A coisa mais linda do mundo” e “A linha que cerca o mar”.
— Ao ouvir o CD, percebi o quanto é original. Poder lançar um artista com um trabalho tão novo é uma das recompensas de um selo independente — completa Bastos.


Os muito jovens voltam à música inteligente
(Pedro Alexandre Sanches, Folha de São Paulo, 22-06-2001)
Por mais que ele queira, não há como relevar o laço existente entre Wado e o imaginário do mangue beat. Se o que marca demais frequentemente acaba virando jaula, o moço terá de conviver com o aprendido dos colegas mais velhos, ao menos até se descolar de fato daquela gramática.
Por enquanto, há muito da filosofia mangue em seu "O Manifesto da Arte Periférica". Mas há também uma profunda diferença, que é o que já particulariza essa cena que se esboça de Maceió para o Brasil: pela primeira vez desde a geração 80, voltam a aparecer no cenário artistas muito jovens e nem por isso inconsistentes.
É o que diferencia Wado de referências suas, como Fred Zero Quatro, Lenine, Chico César, Pedro Luís e Zeca Baleiro. Todos esses demoraram muito a aparecer, erigindo uma geração "nova" de gente de 30, às vezes 40 anos.
Pois bem, Wado está eriçando as antenas, do alto de seus poucos 23 anos. Com pouca idade, pouca matéria-prima e pouco meio de comunicação, alicerça um disco bem sustentado musical e poeticamente, amontoando pequenos achados de linguagem e (nem tanto) de musicalidade.
Em "Uma Raiz, uma Flor", saca da situação desoladora o otimismo que só um moleque sabe manipular, em ritmo de moderno sambão: "Não diga que as estrelas estão mortas/ só porque o céu está nublado/ não se iluda/ pé que dá fruta é o que mais leva pedra".
Vai mais longe, situando-se na chata dicotomia tradição/inovação que ainda norteia a música "nova" brasileira: "Uma raiz é uma flor/ que despreza a fama".
Em "Diluidor", volta ao tema com mais que saudável ironia: "Eu vou ficar quietinho/ eu vou ficar no meu canto/ mas não não engolidor de sapo/ mas não não mestre de desamor/ não sou da raiz nem diluidor". Quanto ao título do disco? Bem, é dilema que ninguém resolveu ainda. [Cotação: três estrelas]


Wado chega advogando a arte da periferia
(Pedro Alexandre Sanches, Folha de São Paulo, 22-06-2001)
Em 1996, o pernambucano Fred Zero Quatro declamava com seu Mundo Livre S/A: "Não espere nada do centro/ se a periferia está morta/ pois o que era velho no norte/ se torna novo no sul". Esse parece ser o ponto de partida do quase alagoano Wado para se lançar agora com um disco de estréia que se chama "O Manifesto da Arte Periférica".
Wado tem 23 anos e é quase alagoano, porque nasceu em Santa Catarina, embora viva desde os oito anos na Alagoas de Djavan, dos Collor, da petista Heloísa Helena e, mais recentemente, de uma cena pop de artistas muito jovens, liderados (se tanto) por nomes como Wado e a dupla Sonic Júnior.
"É um Estado pobre, com índices ruins de analfabetismo. Mas não acredito que seja tão diferente do país inteiro", diz o moço por telefone, do Rio, descrevendo a periferia que o motiva a criar e a já abrir o CD com versos como "você bem sabe em que ponta/ a corda sempre arrebenta".
Responde sobre a existência de uma possível cena em Maceió, como houve de seis anos para cá em Recife, com o mangue beat de Fred Zero Quatro e Chico Science:
"O nível está muito bom, Sonic Júnior e Mopho já apareceram em São Paulo e Rio. Acho que as pessoas em Alagoas só não se ligaram ainda como cena por falta de auto-estima. Estamos tentando nos juntar como um grupo mesmo".
Recém-formado jornalista, Wado já enfrenta o paradoxo de ter de fugir do norte para se fazer notar no sul: "Com certeza ficarei no Rio até o final do mês. Se não conseguir "trampo", volto para Maceió. O ideal seria ficar lá, mas isso não é a realidade".
Não estaria entrando em contradição com o título do disco? "É uma pena ter que descer, mas é aqui que as coisas acontecem. A gente não existe, estou existindo só a partir de agora. É triste ver tanta gente boa que não existe. O conceito do CD é que se crie e produza arte na periferia, como fiz. Como [o antropólogo" Hermano Vianna falou, a periferia não é um lugar. Há um Buena Vista Social Club em cada morro do Rio."
Wado fala, enfim, da tradução sonora de seus preceitos: "O ponto forte são as timbragens. Misturamos timbragens antigas, dos anos 60 e 70, o Jorge Ben antigo com um pouquinho de ruído do atual. A gente passeava pelo rock, mas ele foi substituído pelo samba e pela música brasileira. Escuto Secos & Molhados, Novos Baianos, Banda Black Rio".
Não vê em tal prática reprocessadora -nem no manifesto pela arte periférica- um parentesco inexorável com o mangue beat.
"Não acho que seja filiado ao mangue beat, na minha opinião não tem nada a ver. A mistura sempre foi da música brasileira. O mangue é um conceito fechado, no meu nem existe um manifesto como houve o do mangue beat. Meu manifesto é o disco", afirma Wado. Tropicalismo, então? "Tem, sim, não tenho vergonha de dizer."
Sua arte periférica chega ao centro da periferia -São Paulo- ao vivo, pela primeira vez, na próxima sexta, quando Wado se apresenta no festival London Burning, no Orbital (r. Augusta, 2.894, tel. 0/xx/11/5096-0737).


'Até agora o melhor disco do ano'.
(Alexandre Matias, Correio Popular - SP)
Eis que entra na roda da varanda Wado, o novo nome do pop alagoano. Aliás, parêntese aqui: Maceió cada dia se firma como "nova Seattle", devido à quantidade de bandas novas e espírito rock’n’roll que cresce na cidade. Primeiro, veio o Mopho; depois o Sonic Júnior (ambos no Abril Pro Rock deste ano, a primeira em Recife, a segunda em São Paulo) e agora vem Wado, com seu excelente O Manifesto da Arte Periférica, até agora o melhor disco de 2001. Sai Daft Punk, sai Vídeo Hits - o lugar é deste catarinense radicado em Maceió que conseguiu fazer um disco com sotaque, mas sem soar pós-mangue beat. Os dois discos que mais gostei no ano passado foram o do Mundo Livre S/A e o do Badly Drawn Boy. Wado converge os dois e cria um Damon Gough sambista, praiano. Com uma mensagem clara (e tão aprazível quanto todo o universo de Jorge Ben), uma banda afiada e um suíngue gostoso, Wado despretensiosamente coloca-se entre os novos grandes e, como quem não quer nada, busca seu lugar ao sol. Dê um jeito de caçar: só a faixa A Linha Que Cerca o Mar vale a bolachinha."


'Um raro pop inteligente e acessível'
(Pedro Só, Usina do Som)
O título pode parecer marketeiro, e é mesmo, seguindo a escola malandra do mangue beat, uma das armações culturalmente mais salutares já engendradas no Brasil. Pretensioso? Também, o próprio Wado admite que assumiu o risco de ouvir tal adjetivo ao escolher um nome assim. Nascido em Santa Catarina, há 23 anos, o cantor e compositor criado em Maceió chega escolado nas manhas que fazem repercutir no eixo Rio-São Paulo o trabalho de nordestinos e demais periféricos. A despeito da formação autodidata do artista, porém, este disco de estréia traz uma musicalidade bem maior do que a ouvida na maioria dos lançamentos identificados com o mangue (de mais a mais, um gênero deveras supervalorizado).
A sampleagem de bom gosto e as soluções melódicas fazem de “A Linha Que Cerca O Mar”, registrada com a banda Santo Samba, uma canção maior brotada em uma geração que parece estar involuntariamente enterrando o formato. Na recriação funkeada de “Ontem Eu Sambei”, de Fabio Trummer (da banda pernambucana Eddie), também se percebe um raro pop inteligente e acessível. E o mais interessante é constatar que Wado não está sozinho nessa: “A Coisa Mais Linda Do Mundo”, de seu parceiro Alvinho, mesmo em seu minimalismo jamaicano, aponta para a delicadeza acústica que a MPB parece ter perdido em suas atuais versões “grelos falantes”.
A influência de Fred 04, do mundo livre s/a, é uma referência facilmente identificável, seja na forma de fazer sambas como “Uma Raiz, Uma Flor” ou no lirismo indignado de bons slogans presente nas faixas “A Tragédia Da Cor” e “Alagou As”. Mas o acabamento dado pela produção – do próprio Wado e de Juninho, do grupo-revelação Sonic Jr. – gira em outra órbita, em outro milênio.


A mais festejada novidade da música brasileira desta ano lança manifesto em CD
(Kiko Ferreira, Estado de Minas, 01-07-2001)
Jornalista, 23 anos, nascido em Florianópolis e criado em Maceió, Oswaldo Schlikmann, de nome artístico Wado, lança oficialmente no próximo dia 30, na festa London Burning, na casa Orbital, em São Paulo, o CD “O Manifesto da Arte Periférica ”.
O disco, de apenas 29 minutos de duração, é a primeira tentativa de disco conceitual vinda do Nordeste desde o manifesto mangue bit (beat) de Chico Science. Sucesso no Rec Beat do carnaval deste ano em Recife, o compositor, cantor, instrumentista e desenhista vem da banda de rock Ball, mas amplia as possibilidades rítmicas com samba, funk, jazz e outras influências. Confessando ter se inspirado no método de gravação de Jorge Benjor para realizar seu trabalho independente, Wado quer, com seu manifesto, chamar a atenção para os discos que são produzidos fora do eixo Rio-São Paulo.
Na primeira música de trabalho, “Alagou As ”, que sai com clipe na MTV, ele prega que “a margem chegue ao centro ”e “que se mostre no grande circo ”, levantando explicitamente a bandeira “da diversidade, dos compositores de bairros distantes ”. Disposto a engrossar o coro dos que querem que Alagoas volte a ser conhecida como terra de Djavan e Hermeto Pascoal, e não de políticos de orientação ética duvidosa, o alagoano por adoção (vive em Maceió desde os 8 anos) chega inspirado por Luiz Melodia, Banda Black Rio, Novos Baianos, Mutantes, Benjor e outras fontes em comum com Max de Castro, Simoninha e outros Artistas Reunidos. No encarte, cita uma letra da turma de Moraes Moreira (“minha carne é de carnaval / meu coração é igual ”) e inclui desenhos que poderiam ter sido feitos por Arnaldo Baptista nos anos 70. Com um som cru e simples, a cargo de sua guitarra e violão, mais Alvinho (guitarra) , Juninho da Sonic Júnior (bateria) , Glauber (baixo) e participações especiais de flauta e percussão em algumas faixas, o disco teve maior parte gravada num estúdio de Maceió. Sem merecer o rótulo de genial colado por alguns apressados em busca de novidade, Wado tem um trabalho de consistência, e merece sucessivas audições e votos de sucesso na tarefa de chamar atenção para o Brasil além do eixo.


Você está pronto para Wado?
(Carlos Marcelo, Correio Braziliense, 09-07-2001)
Maior destaque da promissora safra de novos artistas alagoanos, cantor de 23 anos lança o manifesto da arte periférica e reestabelece a ponte entre o rock e a MPB em seu CD de estréia.
Wado mente. Ao contrário do que afirma em Diluidor, uma das onze faixas do disco de estréia, tudo que ele não quer neste momento é ‘‘ficar quietinho, ficar no meu canto’’. Muito pelo contrário: está disposto a correr pelo Brasil para impulsionar a cena de Alagoas e divulgar o Manifesto da Arte Periférica, a mais eficiente ponte entre a linguagem rock e a música brasileira desde Samba Esquema Noise, do Mundo Livre S/A.
Antes que alguém critique a pretensão do cantor em lançar um manifesto aos 23 anos de idade (‘‘o pessoal achou o título meio pesado, mas essa é a verdade do disco’’), ele explica as suas idéias.‘‘O Brasil é um continente formado por vários países, mas só dois desses (Rio e São Paulo) emitem cultura para os outros. Então, tudo que é produzido fora desses dois países acaba sendo encarado como periférico’’.
No caso de Wado, o conceito de periferia cultural ainda é mais presente: afinal, ele nasceu em Florianópolis, cidade vizinha de uma metrópole regional, Porto Alegre. Atravessou o Brasil para viver na mesma realidade. Mora em Maceió, cidade tradicionalmente ofuscada pelo que vem de Recife, berço do mais vibrante movimento musical dos anos 90: o mangue beat.
"Sou admirador do mangue beat. Ouvi muito e continuo escutando Chico Science, Nação Zumbi e mundo livre s/a. Mas não me considero influenciado por eles: estou mais próximo dos outsiders do movimento, como o Eddie", conta o cantor, que regravou Ontem eu Sambei, composição original de Fábio Trummer, da banda pernambucana.
Na regravação, Wado cita os versos marcantes de Samba e Amor, de Chico Buarque: ‘‘Eu faço samba e amor até mais tarde/E tenho muito sono de manhã’’. Já na faixa de abertura, A Tragédia da Cor, é a vez de Caetano Veloso ser lembrado em discreta referência ao refrão de A Tua Presença Morena. Em ambos os casos, as citações são bem sacadas e mostram uma das habilidades do Wado compositor: a costura precisa do novo e velho.
Ele assume a admiração por Chico e Caetano, adicionando à lista os nomes de Jorge Ben, Novos Baianos e Naná Vasconcelos — de quem sampleou a risada na música Um Um. Por isso, Wado não considera seu Manifesto um disco bairrista nem regionalista: ‘‘É um disco de música brasileira’’. Tanto é verdade que está sendo lançado por uma gravadora independente carioca, Dubas, do compositor Ronaldo Bastos. ‘‘Não tem um disco com a densidade como o dele no mercado brasileiro hoje’’, acredita Bastos. ‘‘É um cara instigante e carismático, com um grande caminho pela frente: um artista que merece ser ouvido’’, sentencia o dono da Dubas.
Apesar de morar em bairro de Maceió a 40 minutos da praia mais próxima, Wado se deixa contaminar pelo arejado clima do litoral. O quase-reggae Beijou Você, por exemplo, foi inspirado na atmosfera relax da Praia do Francês. ‘‘Quis que o violão soasse como a água do mar, quando ela fica cristalina por causa do vento terral e dá até para ver a sua sombra na areia dentro d‘água’’, devaneia.
Letrista promissor, o jornalista recém-formado surpreende com frases desconcertantes como as de Uma Raiz, Uma Flor: ‘‘Uma raiz é uma flor que despreza a fama’’. Em Alagou As, em meio a uma batida seca e sombria, brinca com o nome do estado que o adotou: ‘‘Alagou as terras do meu coração/ molhou, encheu de lágrimas’’. O resultado é sinuoso e envolvente, reforçado pelos acordes derivados da levada benjoriana. ‘‘Como Jorge Ben, gosto de priorizar os primeiros takes na gravação para valorizar a espontaneidade’’, compara.
O HIT DO DISCO
E se há um hit no disco, ele se chama A Linha Que Cerca o Mar. É daquelas músicas que são descobertas, cantadas, memorizadas e amadas por uma turminha antenada até o dia em que um medalhão da MPB resolve regravá-la. Aí, os mudernos passam automaticamente a odiar a regravação e desprezar o original. ‘‘É o meu tema de novela’’, brinca Wado.
Outra faixa de altíssimo teor pop é Feto, mas essa foi ‘‘estragada’’ pelo próprio cantor, que inseriu gravações ao contrário justamente na hora em que o refrão começa a grudar. ‘‘Manipulei porque podia ficar muito pop e quebrar o conceito do disco, que tenta equilibrar o palatável com o experimental’’, explica.
Depois de ouvir seguidas vezes o Manifesto..., fica uma certeza: é uma estréia espantosamente madura para um cara de 23 anos, a mais impressionante dos últimos tempos — pau-a-pau com Melodias de Uma Estrela Falsa, do Astromato. Mas se a banda paulista se destacou pela capacidade de adaptar ao português as influências de grupos britânicos dos anos 90, Wado surpreende agora pela desenvoltura no estabelecimento da ponte da linguagem rock com o melhor das melhores fases de grandes nomes da música brasileira. Ele está pronto para conquistar o Brasil. Resta saber se o Brasil está pronto para deixar que a margem, enfim, chegue ao centro.


'O trabalho forte, inteligente e original de Wado faz uma espécie de síntese da MPB moderna.'
(Juarez Fonseca, ABC de Porto Alegre)
Wado chega com um manifesto da periferia
Mesmo quando o rádio está atropelado de porcarias, há artistas que, vindo do desconhecido, põem a cabeça para fora e avisam que isso não consegue quebrar a espinha da música brasileira de qualidade. É o caso de Wado, nascido em Santa Catarina e criado em Alagoas. Seu disco de estréia, O Manifesto da Arte Periférica, revela um cantor e compositor em quem se deve prestar atenção. O trabalho forte, inteligente e original de Wado faz uma espécie de síntese da MPB moderna. A idéia central do disco está no título e é resumida na faixa Alagou As, um samba cuja letra levanta “a diversidade de compositores de bairros distantes”, pregando “que a margem chegue ao centro”. Em outra música, ele se define: “Não sou da raiz nem diluidor”. As letras são rápidas e diretas, os músicos e arranjos também são muito bons, usando signos pops com segurança e criatividade. Wado. Guarde esse nome.


Wado: sem medo de ser underground, sem medo de ser pop
(Vladimir Cunha)
Quem primeiro me chamou a atenção foi o Matias Maxx - que a essa altura já deve estar em Miami detonando o seu estoque de camisas floridas, algumas das quais, acreditem vocês, são feitas do mesmo tecido que as calças do cara. Desde o começo desse ano, todo e-mail que eu recebia dele vinha com um verso à guisa de assinatura. Os mais frequentes eram "Não diga que as estrelas estão mortas/Só porque o céu está nublado" e "Na linha que cerca o mar/É lá onde eu quero
estar".
"De quem é isso, Maxx, é teu?"
"Não, é do Wado, cara"
"Que Wado?"
É, que Wado? Porque um artista que ninguém conhecia de repente está dando tanto o que falar? Em menos de seis meses ele balançou o coração das indie-girls na festa da London Burning, foi apontado como a salvação do pop brasileiro, virou o
assunto do momento nos cinco dias de Abril Pro Rock (sim, para mim, que estava no apê do roque, foram cinco dias de peripécias no Recife) e ganhou reportagens elogiosas em praticamente todos os jornais "que importam" (leia-se O Globo,
Estadão e Folha). Não é nem preciso dizer que, agora, um bando de gente bacana anda espalhando por aí que gosta do Wado desde a época em que as calças Gledson estavam na moda. Apesar disso, ele fala na maior tranquilidade que não espera vender mais do que 500 cópias de seu CD de estréia. Children, don't believe the hype...
Mas afinal, quem é esse cara?
O que acabei descobrindo nesta entrevista é que o Wado é um homem com uma missão: mostrar ao Brasil que existe vida inteligente além das fronteiras de São Paulo. Com apenas 23 anos, este alagoano lançou aquele que talvez seja um dos
melhores discos de 2001: "O Manifesto da Arte Periférica". É um som de fusão, que consegue apontar uma saída para a música brasileira sem cair no regionalismo de ocasião ou na desgastada fórmula do mangue bit. Em alguns momentos soa como se fosse um Jorge Benjor experimental e maconheiro (não que o Babulina jamais tenha fumado, mas quem sou eu para ficar falando dele?). Em outros, consegue a proeza de ser pop e inteligente ao mesmo tempo. Como na música "A Linha que Cerca o Mar". Fosse o Brasil um lugar decente, ela já teria estourado em todo o país. Dá até para imaginar o Wado cantando para a Feiticeira no Super Positivo e participando do Jogo do Banquinho no Raul Gil. Ou então, fazendo playback no Planeta Xuxa rodeado de paquitas e meninas se esgoelando no tradicional corinho de "lindo, tesão, bonito e gostosão!". Só que as coisas aqui não são como a gente queria que fossem. No momento em que termino este texto, Sandy & Júnior pontificam entre os vídeos mais pedidos da MTV e O Surto é apresentado pelo Fábio Júnior como "a nova cara do rock brasileiro". Pelo menos nos resta o underground. Ainda bem, pois é nele que se desenrolam as mais estranhas e inventivas maquinações sonoras.
Entrevista:
O nome do seu disco é "Manifesto da Arte Periférica". Porque um título tão provocador?
Porque ele trata das coisas que estão longe dos grandes centros e da dificuldade em se fazer arte fora do eixo Rio/São Paulo. O ideal seria que o Brasil tivesse mercados regionais que se sustentassem sem precisar do aval do sudeste do país. Tem gente aqui no nordeste que está batalhando há anos e ainda não conseguiu obter reconhecimento. Eu mostrei meu disco para o Hermano Vianna e ele falou uma coisa interessante: o que não é centro é periferia. Então, a gente acaba tendo dois "países", Rio e São Paulo, que dominam um país inteiro. Isso gera um empobrecimento muito grande na cultura nacional, pois cria uma situação em que esses estados passam ser os únicos propagadores de informação.
De certa fora, não é um tanto triste ter que ir em direção a esses estados para se fazer notar? Não seria mais interessante que o "centro" tivesse mais curiosidade com relação ao que acontece na "periferia"?
É foda, cara. É foda ter que sair daqui atrás de São Paulo e Rio de Janeiro. Por outro lado, se eu ficar aqui em Maceió não vai rolar nada. É triste mas é necessário bater na porta do sudeste. Eu tenho muita vontade de lutar pelo reconhecimento das outras regiões brasileiras, de criar mercados locais que sejam integrados a outros mercados locais e que permitam um intercâmbio maior entre os independentes. Hoje em dia está mais fácil fazer isso. Até mesmo por causa da tecnologia. Muitas bandas já conseguem gravar em casa com uma qualidade legal.
Tanto que, de uns tempos para cá, o underground brasileiro cresceu de forma considerável. Neste cenário promissor, que bandas você destacaria?
Eu posso falar do nordeste. O Cidadão Instigado, que está gravando em Fortaleza, é uma ótima banda. O Eddie é muito legal. Aqui em Maceió tem o Dread, que faz um metal moderno bem interessante, e o Santo Samba, minha ex-banda. O Sonic Júnior e o Mopho também são grupos que se sobressaem na cena.
Fiquei bastante impressionado com as suas letras, que são simples mas eficientes. Principalmente no caso de "A Tragédia da Cor", que fala de desigualdades sociais mas não é panfletária. Foi difícil obter esse resultado?
Eu considero as letras um dos pontos fortes do meu trabalho. Logo que comecei a compor eu quase não tratava de temas sociais. E sempre que tentava fazer algo nessa linha, o resultado saía forçado. Só que nesse disco eu consegui um
equilíbrio entre o lado poético e o lado contestador. Demorou mas acabei chegando onde queria.
E o que te levou a querer abordar temas sociais?
É que certas coisas ficam me remoendo por dentro, sabe? "A Tragédia da Cor" foi assim. Eu fiz depois de ter visto na televisão a cobertura do sequestro do ônibus 174, no Rio de Janeiro. Cara, eu estava no Rio na época e fiquei três horas na frente da TV acompanhando tudo, com a cabeça a mil. No dia seguinte sentei para compor e praticamente vomitei a música. Não foi nada planejado, de querer fazer críticas sociais, e sim a necessidade de me expressar sobre algo que estava me incomodando naquele momento.
Você é um dos poucos artistas a promover a fusão do rock com a música brasileira que não soa oportunista e nem derivativo da turma de Recife. Como você chegou às misturas presentes em "Manifesto da Arte Periférica"?
Já toco há cinco anos. Comecei no rock. No entanto, sempre me liguei em música brasileira. A fusão foi gradual, mas longe do regionalismo. Tudo aconteceu sem forçar a barra. E nisso posso dizer que sou bastante criterioso. Tanto que descartei algumas idéias que surgiram no decorrer dos ensaios apenas por achar que elas soavam artificiais demais. Foi essa preocupação com a espontaneidade e com a qualidade do trabalho que acabou fazendo com que o disco saísse variado e,
ao mesmo tempo, com uma unidade conceitual.
Falando nisso, o disco tem uma sonoridade bastante peculiar. Certos instrumentos estão bem crus e é possível notar até mesmo que houve vazamento de som na hora da gravação . Essa estética despojada foi uma opção sua?
O estúdio do Juninho (do grupo alagoano Sonic Júnior) é modesto. A bateria, por exemplo, foi gravada só com dois microfones, que captaram o som ambiente. No começo as pessoas estranharam a gravação. Ela não é nem anos 70, nem anos 80 e nem anos 90. Na verdade, ela soma tudo isso e resulta nessa estética que criei. Para me orientar, me apoiei nas mais variadas influências: discos antigos de MPB - Novos Baianos, Naná Vasconcelos e Banda Black Rio -, Medeski Martin Wood, o primeiro CD do Cidadão Instigado e o próprio Sonic Júnior. Tem também muita coisa de eletrônica através de sons criados em samplers. Gosto dos anos 70 mas não quero soar anos 70.
O pessoal da gravadora não estranhou a sonoridade do disco?
Um pouco. Eles ficaram meio desconfiados porque ela não tem o padrão das gravações feitas no sudeste. Mas era isso mesmo que eu queria. Como falo do que está fora do eixo, não fazia sentido seguir o mesmo padrão de São Paulo e do Rio
de Janeiro. Era mais interessante criar meu próprio padrão.
E os shows fora de Alagoas? Soube que a apresentação na festa da London Burning foi bem legal...
Foi sim. Muita gente curtiu, prestou atenção no meu trabalho e veio me cumprimentar depois do show. Eu conheci o Luciano Vianna no Abril Pro Rock e entreguei uns CDRs para ele, já que o disco oficial ainda não havia sido lançado. Ele gostou do som e me chamou para tocar na festa dele. O interessante é que eu não tive dinheiro para trazer minha banda para São Paulo e já estava quase pensando em me apresentar só com voz e violão. Quem me deu uma força foi o pessoal do Oito, que ia tocar no mesmo dia e acabou virando minha banda de apoio. Pegamos dez músicas em três ensaios e metemos a cara. Felizmente deu tudo certo e as pessoas gostaram. É muito difícil tocar fora do nordeste mas acho que estou conseguindo me firmar aos poucos. Principalmente por causa da repercussão na mídia. Tanto que, no mês que vem, estou querendo descer para tocar novamente em São Paulo e no Rio de Janeiro. Ando pensando também em fazer shows acústicos em praças e estações de metrô. Mas isso ainda é projeto...
Mas já dá para viver de música? Atualmente você faz o que?
Sou formado em jornalismo mas estou sem emprego. Tento viver de música e ainda moro com a minha mãe. Na verdade, estou sem renda fixa. Faço música porque tenho que fazer...não consigo parar de compor.
Infelizmente, você é mais comentado do que propriamente ouvido...
É foda. Mas eu quero mais é que as pessoas me escutem, embora saiba de todas as dificuldades de mercado que envolvem os independentes. Se você for ver, esse meu disco é bem humilde. A tiragem é pequena e nem sempre conseguimos chegar a todos os lugares. Mas vou passar a ser distribuído pela Universal, o que é bom e ruim ao mesmo tempo. Bom porque o disco vai ter mais visibilidade. E ruim porque ele chega nas cidades mas chega com preço de disco da Universal.
E se o Wado virar hype? Você sabe como isso é fácil de acontecer. Ainda mais no underground. Aí periga de você virar um artista cultuado mas que não vende nada...
Olha, eu prefiro que não role essa história. Mas se eu virar hype e não vender nada, pelo menos alguma coisa aconteceu. É melhor que nada, não é? (risos). O que eu quero é continuar com o meu trabalho, não importa como. Se fizer sucesso,
ótimo. Não tenho medo do pop. Ele que me aceite do jeito que eu sou.


Música alagoana faz bonito no Rec Beat, em Recife
(Walmir Santos, Folha de S. Paulo)
Com a maioria das atrações colhidas em seu quintal, ainda assim a sexta edição do Festival Rec Beat, encerrada na última terça- feira de carnaval, conseguiu traçar um painel bem bolado da massa sonora menos óbvia que pulsa em capitais como Maceió, Belém, Belo Horizonte, Porto Alegre, Rio e São Paulo, com adendo do grunge e do blues norte-americano.
De ascendência alemã, criado em Maceió, o cantor e compositor Oswaldo Schlickmann, o Wado, 23, apresentou O Manifesto da Arte Periférica, disco e projeto da banda que leva seu nome. Não se pretende dogmático, mas reivindica incentivo à “música popular contemporânea além do eixo Rio- São Paulo”.
Wado, assim como outros da capital alagoana (Sonic Jr., Mopho etc.), tentam melhorar a auto-estima do Estado maculado nos últimos anos pela corrupção política. “O trabalho começa dentro de casa, fomos muito abalados. Praticamos agora um bairrismo positivo”, afirma Wado.


'Na primeira audição o ouvinte já percebe o que de melhor pode ser extraído da babel sonora.'
(Marcos Toledo, Jornal do Comércio - PE)
Grave bem esse nome: Wado. É cantor, mas não é brega. Muito pelo contrário. Esse músico florianopolitano, radicado em Maceió, dá uma mostra hoje, no Rec Beat, do som que realizou para seu disco de estréia, no qual canta, compõe, toca, arranja e produz. O Manifesto da Arte Periférica não introduz grandes novidades, mas reforça o que vem sendo feito de melhor na nova MpopB.
Wado, 23 anos, já esteve no Recife nos idos da antiga Soparia, com sua Ball (1996-2000). Com o fim da banda, continuou compondo e, ainda no ano passado, gravou quatro das canções com uns amigos.
O resultado agradou ao músico que, junto com o baixista Glauber e o bateirista Juninho (ex-Living the Shit, outro grupo conhecido pelos pernambucanos) viabilizou o primeiro álbum. Em consenso, resolveram batizar o projeto com o próprio nome de Wado, autor de quase todas as composições.
“Estamos muito satisfeitos com o trabalho”, confirma o band leader. “É um disco conceitual, que fala da produção de fora do eixo Rio-São Paulo”, define. Poético, não fica atrás do que é produzido em qualquer canto do país.
Wado afirma que ouviu muito jazz, funk e música brasileira antes de conceber o disco. E não é da boca pra fora. Numa primeira audição, o ouvinte já percebe que na ‘bolacha’ há o que de melhor pode ser extraído da babel sonora que encanta e, ao mesmo tempo, polui esse mundo globalizado”. “Para fazer esse disco, li muitas matérias que falam da forma como Jorge Bem gravava seus discos”, revela.
Mas as influências não param por aí. Na faixa Diluidor, por exemplo, surgem samplers da banda Black Rio, mixados a um choro de um índio matogrossense, extraído do Choro Ritual, fonograma da tribo Bororó.
O cantor, nascido em Florianópolis (SC), mas que vive em Alagoas desde os oito anos de idade, produz um som encorpado, no qual reúne letra, ritmo e harmonia com precisão. E com suingue.
Flerta com o free jazz (Alagou as), com o samba (Uma raiz, uma flor) e até com o baião (na balada A coisa mais linda do mundo). Na lista, há ainda Ontem eu Sambei, de Fábio Trummer (da banda Eddie, a preferida de Wado na cena pernambucana).
Se corresponderem no palco da Rua da Moeda ao trabalho de estúdio, Wado e banda podem vir a ser uma das revelações do festival. “Estamos orgulhosos de tocar no Rec Beat”, reverencia o cantor.


'Alagoanos sabem o que é diversidade e agora estão reclamando a sua fatia desse bolo'.
(Michelle Assumpção, Diário de Pernambuco)
Expectativa entre as atrações deste domingo no Rec Beat é a presença do alagoano Wado. Ele é brother da banda Ball, da mesma cena de onde saiu a Living in the Shit e, depois, Sonic Jr. O rapaz vem praticamente estrear seu trabalho para o grande público, pois, como Wado, ele realizou apenas pequenos shows. “Começamos a não nos divertimos mais juntos, então a banda acabou. Continuei compondo e, na necessidade de gravar, chamei uns amigos” , conta ele, sobre seu ingresso na carreira solo, que acabou acarretando em nova formação , em entrevista por telefone.
Wado e seus amigos gravaram o disco Manifesto da Arte Periférica, um trabalho conceitual, feito somente para divulgar o trabalho solo de Wado, que versou sobre uma questão pertinente no cenário de música local e de qualquer cidade que não se localize no Sudeste do país. “O Brasil é um continente. Ter apenas dois países que projetam sua música – neste caso, São Paulo e Rio de Janeiro – significa que muita coisa está se perdendo”, avalia.
Na letra da música Alagou As, ele resume um pouco da idéia central do CD: “A margem chega ao centro/ que se mostre no grande arco/ levanto essa bandeira/ a bandeira da diversidade/ dos compositores de bairros distantes/ levo este estandarte”. O disco conta ainda com uma versão de Ontem Eu Sambei , da Eddie, e está rendendo a Wado vários elogios. O músico veio ao Rec Beat por conta da bolachinha que também agradou ao produtor do Rec Beat.
A banda que acompanha Wado é experiente, alguns saíram da antiga formação do Living in the Shit. Tem um flautista, um guitarrista e ele, na voz e violão. O som é como se a palavra ball virasse bola. Quer dizer, o que era americano, virou brasileiro; o que era rock´n´roll, está mais para o samba. Se bem que, aqui e ali, tem funk, hip hop e umas pitadas de eletrônica, pois ninguém ficou imune a isso. “As nossas referências estão no disco: Eddie, Sonic Jr, a nova cena de Maceió, fora as coisas antigas que gostamos muito, como samplers do Black Rio, dos anos 70”.
Wado nasceu em Florianópolis, mas musicalmente é alagoano. Nunca assumiu regionalismos. Gosta de trabalhar com o samba, mas acha que como comportamento, a cena de Maceió está mais forte agora. O sentimento que os pernambucanos experimentaram com o manguebeat, ele diz que os alagoanos estão começando a conhecer agora, com a explosão do cenário nacional de bandas como Mofo, de um estilo psicodélico herdeiro dos Mutantes. Sem falar na própria Sonic Jr, eletrônica, e na Dread, de heavy metal. Quer dizer, os alagoanos também sabem o que é diversidade e agora estão reclamando a sua fatia desse bolo.


Manifestação de um bom pupilo
(Marcos Toledo, Tô Na Boa)
De Alagoas surge mais um representante da veia pop nacional que tenta renovar a linguagem da MPB. Veia que inclui nomes como Chico César, Zeca Baleiro, Vitor Ramil, Lenine, Fred 04, Wilson Simoninha e Max de Castro. Lançando mão de sua própria fórmula, Wado se identifica facilmente com a maior parte de seus antecessores acima citados.
O músico, que possui uma relação bem próxima de Pernambuco, põe no mercado 'O Manifesto da Arte Periférica' (Dubas Música/Universal), seu CD de estréia. O jornalista catarinense Oswaldo Schlickmann, 23 anos, mais conhecido por 'Wado', diz-se adotado por Alagoas, terra de Djavan e Hermeto Pascoal, que faz questão de citar.
Ele, que já havia passado pela antiga Soparia, no Recife, com sua ex-banda Bowl, teve a oportunidade de mostrar a evolução de seu trabalho no último Rec-Beat de Carnaval. Para os pernambucanos, Wado pode parecer facilmente com algo já visto antes - a primeira recorrência é a Mundo Livre S/A. E parece. Mas há uma explicação: ambos, Wado e 04 bebem sedentos de uma mesma fonte mais notada, que é Jorge Benjor (o catarinense até confessa que leu matérias que narravam o processo de gravação do Ben).
Isso fica claro em faixas como 'A tragédia da cor' e, principalmente, 'Uma raiz, uma flor'. Na mesma 'Uma raiz...' e, em poucas outras, o contrabaixo é dispensado. Na maioria das demais faixas, o tal instrumento é executado pelos músicos Glauber (ex-Living in the Shit) e Beto Machado. Com especial destaque para este último, que acrescenta sua notada experiência de black music em 'Feto - reproduzida ao contrário a partir da metade da faixa.
Um trabalho bastante personalizado consegue fazer esse Wado. Das 11 faixas, quatro são apenas dele e outras quatro em parceria. As três exceções ficam por conta do flautista Juca (o solo auto-acompanhado 'Sopro'); do guitarrista e co-produtor Alvinho ('A coisa mais linda do mundo'); e de Fábio Trummer (o ex-frevo 'Ontem eu sambei'), guitarra e voz da pernambucana Eddie - banda predileta de Wado em Pernambuco. (Para quem não sabe ou lembra, Fábio teve outra de suas composições, 'Quando a maré encher, gravada pela banda Nação Zumbi e pela cantora Cássia Eller).
Os temas das letras são os do cotidiano, mas há espaço também para a poesia. Por vezes o músico aparece engajado ("... Ninguém sabe da dor/ da tragédia da cor negra"), ora apaixonado ("O que você me fez não há"). A proposta ideológica contida no título do disco - gravar independente em Alagoas assim como em qualquer região 'periférica' - existe. Wado chega a ensaiar um discurso mais arraigado em 'Alagou as'. Mas, como deseja, não chega a ser 'panfletário' e nem caracteriza o álbum como político. No contexto geral da obra, em momento algum o discurso se confunde com o resultado sonoro.
A experimentação é uma das característica (e arma) principais do artista. Configura o trabalho do rapaz como pop, com doses a gosto de rock, soul, funk, samba, mangue, eletrônica, baião. Mas nada que se permita rotular. Apenas um trabalho autoral de um jovem compositor-cantor-arranjador-instrumentista-produtor que tem consciência de seu papel no cenário da nova música popular brasileira. A conferir.


Que a margem chegue ao centro: Dubas assina o manifesto de Wado
(Édison Viana, Dubas, 2000)
Jorge Ben, Black Rio e Luiz Melodia foram referências deste disco que experimenta timbres e letras fortes sem exageros panfletários, sem esquecer de canções de amor e para sambar.
Catarinense adotado por Alagoas, jornalista, desenhista, produtor, mas sobretudo compositor, músico e cantor, Wado chega com O Manifesto da Arte Periférica, documento pela valorização dos discos produzidos fora do eixo Rio - São Paulo. É seu passaporte para o centro da música brasileira, e ele se apresenta, devagar e tranqüilamente, sem sobrenome ou parentesco artístico, neste início de século ávido por filiações e por descobrir novos gênios.
O disco devolve a Alagoas a imagem do estado que nos trouxe Djavan e Hermeto Pascoal. Foi gravado em Maceió, graças à teimosia e todas as economias do autor. Com o que seria troco no orçamento das majors, pagou estúdio e músicos. Reuniu esforços e sacrifícios pela obsessão de se firmar como artista da música.
Não se trata, entretanto, de um brado rancoroso. Dilui idéias densas na busca de uma sonoridade própria, experimenta timbres e consegue resultados saborosos, em não mais que 29 minutos. Não esquece do amor como tema. Nem do objetivo de dançar, mesmo quando o conteúdo político é mais acentuado. Como na música que abre o disco, A Tragédia da Cor, composta no Rio após o impacto do seqüestro do ônibus 174. Alagou As, canção que segue, explicita o manifesto: "que a margem chegue ao centro, que se mostre no grande circo, levanto esta bandeira, a bandeira da diversidade, dos compositores de bairros distantes". As duas primeiras músicas ganharam democlip e clip, respectivamente.
Uma Raiz, Uma Flor é um texto de Georges Bourdokan, musicado por Wado e Alvinho, parceiro e membro da banda. Pede-se passagem para os artistas aqui reunidos, também sem filiação notória, porém não menos brilhantes: o próprio Alvinho na guitarra e Glauber no baixo; Jan em vocais sedutores; Juca na flauta; Rizotto, Estácio e Charles nas partes percussivas. E além destes Juninho, do Sonic Junior, baterista no disco, co-produtor e co-desconstrutor do manifesto. Feto, quarta faixa, bom exemplo da desconstrução, foi partida ao meio e reproduzida ao contrário.
A colagem aparece também em Diluidor, que inclui um choro indígena do Mato Grosso. Mais à frente, em duas vinhetas, Sopro e Um Um, dispostas como pausa para massagem após os momentos mais pop do disco: Beijou Você e A Linha Que Cerca o Mar (parcerias com Alvinho e Glauber). Mais reconstrução: Ontem Eu Sambei, composição de Fábio Trummer, ganhou outro arranjo. A recriação da música conhecida pela versão original da banda local Eddie surpreendeu o público recifense durante a apresentação de Wado no Rec Beat, no carnaval de 2001.
A singeleza de A Coisa Mais Linda do Mundo, canção de Alvinho, é última página deste almanaque em sua versão sonora indicada pro vídeo de surf, pro panfleto ou pra passeata estudantil, pra cantar indo ao trabalho, pra tocar no rádio, pra guardar entre os livros, pra embalar com a cerveja, pro namoro a dois, pro samba e amor até mais tarde, pras coisas lindas de meu deus.
Construtor e desconstrutor de melodias, artesão de sambas e suíngues, Wado acabou lançando um desafio aos discos de estréia com O Manifesto da Arte Periférica. Um documento que a Dubas lança orgulhosa em revelar o que há de singular na música brasileira. E perpetuado agora, para os que o quiserem descobrir.


E eis que surge Wado.
(Elexsandra Morone, Gazeta.web)
Música que foge do Norte, do Sul, do Nordeste. Música que traz vida, inspiração para todo dia, para todas as noites, momentos e instantes. Como viver a vida, sem música, sem melodia, sem harmonia? Como renascer, sem poesia? Eis a impossiblidade que surge quando se pensa numa existência muda, amordaçada, fadada ao silêncio ininterrupto e insignificante.
Viver a música é um dom. Apreciá-la, tal e qual o imperceptível ato de respirar, é algo que não está reservado a todos. Poucos, na verdade, têm o privilégio de achar – ou criar - uma “trilha sonora” que caiba perfeitamente nos momentos mais díspares de suas vidas.
Imaginar cada situação com tamanha riqueza de detalhes sonoros é, de fato, uma dádiva. O privilégio maior, lógico, é daqueles que vivenciam uma realidade musical plena, criando e recriando sonoridades e canções, embriagando-se por entre acordes e letras, refrões e poesias para o dia-a- dia.
É mesmo delirante a tarefa de indagar o que se passa no imaginário de um músico. Como podem, esses seres, traduzirem em sons o que está guardado, de forma tão íntima, em nosso cotidiano e em nossos pensamentos - tão vastos e imperfeitos? As respostas, impossíveis de serem formuladas sem que, com isso, sejam desenvolvidos os raciocínios mais teóricos, deixam de ter importância a partir do instante em que novas concepções musicais nos são apresentadas. O delírio, novamente, opera fascínio. Dele, ressurgem poesia e musicalidade, elementos imprescindíveis para a continuidade de existências mil, vidas que transitam pelos ouvidos e rumam, sempre, para a mente e o coração.
E eis que surge Wado. Catarinense radicado em solo caeté desde os oito anos de idade, o músico, jornalista, desenhista, cantor e compositor Wado é um dos personagens dessa inquietação sonora que parece “vitimar” cada vez mais mentes – para a felicidade geral dos que adoram inserir belas trilhas sonoras em seus episódios diários.
Com um vigor próprio dos que respiram música – em suas essências mais diversas -, Wado (ex-Ball) está lançando seu primeiro disco – O Manifesto da Arte Periférica -, álbum que sai pela Dubas (Universal) e que recebeu as mais honrosas críticas em alguns dos maiores veículos de comunicação impressa do Brasil (O Globo, Folha de S. Paulo, Diário de Pernambuco e Jornal do Commercio, entre outros), isso sem falar da excelente repercussão obtida na MTV – a emissora dedicou um bom espaço, em sua programação, para que o músico mostrasse seu trabalho.
O Manifesto da Arte Periférica é múltiplo. Personificando um híbrido de referências, influências e gêneros sonoros, o disco desfaz qualquer tentativa reducionista que insiste em dividir os sons, como se estes fossem categorias extremamente distintas de um mesmo universo, o universo plural e ao mesmo tempo singular das sonoridades.
No CD, pop, rock, samba (influência clara de Jorge Ben Jor) e referências eletrônicas convivem harmonicamente, como se estivessem sempre dispostas da mesma forma, uma forma uníssona, que não soa comum em nenhum momento. As canções são preciosidades, músicas que gozam de uma plenitude vívida e que falam de tudo ao mesmo tempo. Claro, ao enxergar o título do disco, a conclusão, óbvia, de que se trata de um “documento” em prol da difusão da arte periférica, aparece como legítima, justa e procedente. Essa impressão, contudo, é parcialmente desfeita à medida em que são degustadas as faixas que compõem o trabalho (são 11 músicas, algumas autorais, outras compostas em parceria, além de releituras).
O grito em favor dos artistas da “margem” continua lá, mas, do mesmíssimo modo, as outras mensagens também se destacam, numa profusão que chega a ser poética, de tão experimental. O Manifesto da Arte Periférica é assim: registro de impressões da vida, não se limita a falar apenas do que está colocado de forma clara em nossa realidade. Wado, como todo ser que vive para e pela música, consegue transcender seu próprio universo, redescobrindo e reverenciando as vagas e imperfeitas existências que povoam o seu redor. E isso é, sim, poesia. Poesia da vida, que respira, livre, sonora.


Sites: uol.com.br/wado / tramavirtual.uol.com.br/wado

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Um comentário:

Rafael disse...

Olá, poderia repostar este disco do Wado, por favor? O link do UOL não mais funciona. Obrigado.